bIFUSP

ANO XVIII - No.38 - 12/11/2001


Edição Especial

Processos seletivos para a contratação de docentes

Encerrada a primeira batalha entre brancos e colorados, com a vitória cabal dos partidários do recurso da Dra. Ing Tan, o Diretor pode abandonar o silêncio de ofício. Trago então algumas ponderações, principalmente aos colegas que não acompanharam de perto os acontecimentos. Comentários sobre as novas "formas de luta" no Instituto, incluindo convocações pela rede e a instrumentalização dos alunos para invadir o CTA, que mais parecem um filme antigo, visto e revisto muitas vezes, vão ficar por enquanto para uma ocasião seguinte.

Na última quinta-feira, realizou-se a reunião extraordinária da Congregação, convocada por mais de trinta membros, para deliberar sobre dois itens relacionados a um conjunto de processos seletivos, encerrados há umas duas semanas, para a contratação de novos docentes. Eu já tinha afirmado, diversas vezes, que o cancelamento de reunião marcada anteriormente para o dia 25 de outubro, e transferida para 22 de novembro, não traria nenhum prejuízo para o recurso da Dra. Ing Tan ou para as propostas do DFAP. Ao contrário, cheguei a dizer que iríamos ganhar tempo, organizando uma discussão mais justa e racional sobre a propriedade e o mérito dos pontos em pauta. Além do desânimo geral para presidir assembléias longas e confusas, essa foi a razão do adiamento.

Vamos aos esclarecimentos.

Durante a minha gestão, que agora praticamente terminou, sempre considerei essencial a renovação do nosso quadro docente. Consegui muito pouco junto à Reitoria: consegui nove cargos de Professor Titular, preenchidos por docentes da casa, com duas exceções; consegui cargos suficientes para regularizar a situação da maior parte dos docentes precários (que foram submetidos a concursos públicos com dignidade e transparência); consegui também, com muito esforço, manter o quadro dos funcionários não docentes. Mas tive pouquíssimo sucesso na substituição do pessoal docente. Na gestão anterior, pela ação do CTA e da Comissão de Pesquisa, chegamos a um acordo unânime para indicar à Reitoria as prioridades do Instituto (que, de fato, foram acatadas pela Comissão de Claros Docentes, presidida pela Vice-Reitora Myriam Krasilchick). No início da gestão Marcovitch tudo mudou. A avaliação departamental foi devidamente esquecida. Os departamentos foram estimulados a propor um plano trienal mirabolante, que acabou esbarrando na crise econômica, e depois foi arquivado. No segundo ano de gestão, fui informado que a Comissão de Claros, presidida agora pelo Prof. Melfi, tinha atribuído duas novas posições docentes ao DFAP e uma ao DFMT, em franca discordância com as nossas prioridades anteriores. Todos podem imaginar a confusão que se estabeleceu. Preciso registrar que estes três claros já foram preenchidos, há mais de um ano, através de processos seletivos convencionais, sem maiores problemas. Após muitas conversas, o Prof. Melfi concordou em acatar as prioridades do Instituto, e garantir a substituição de todas as perdas que não onerassem o orçamento da USP. No momento, temos nove claros docentes que provêm dessas conversas: há cinco processos seletivos realizados (com quatro candidatos indicados e o recurso de nulidade aprovado pela Congregação), um processo em andamento no DFAP, com inscrições abertas até 13 de novembro, e três claros adicionais com editais que ainda devem ser examinados.

Vamos agora ao caráter dos processos seletivos para a contratação de pessoal docente. Aqui na USP há concursos públicos e processos seletivos. Os concursos públicos, que levam à efetivação e são muito bem definidos no Estatuto e no Regimento Geral, estão sob a responsabilidade da Congregação (ouvidos os departamentos). Os processos seletivos são muito mais flexíveis; segundo o Estatuto e o Regimento, estão sob a responsabilidade do CTA, que forma as bancas (ouvidos os departamentos) e homologa os resultados. A flexibilidade é tão grande que, no passado recente, mesmo aqui no IF, houve formas diferentes de realizar processos seletivos para a contratação de pessoal docente (sem mencionar os processos análogos para a contratação de funcionários). Por exemplo, o recurso da Dra. Ing Tan refere-se a um claro docente que havia sido ocupado por determinado colega, contratado há cerca de seis anos, através de processo seletivo sem especificação de departamento. Este colega foi indicado pelo próprio CTA, que funcionava como banca, e depois escolheu o departamento em que gostaria de ser lotado (no caso, o DFAP).

Para evitar a existência de procedimentos muito díspares nas diferentes Unidades, a Comissão de Legislação e Recursos (CLR) do Conselho Universitário aprovou um conjunto de normas que regem os processos seletivos para a contratação de pessoal docente. A Consultoria Jurídica (CJ) também tem um boneco de edital, que serve de modelo às Unidades. Portanto, os editais para os processos seletivos devem ser feitos de acordo com as Normas da CLR e o modelo da CJ. Os processos seletivos são regidos pelos editais e, supletivamente, pelos dispositivos do Regimento Geral referentes aos concursos públicos. Lembrem-se agora que, no seu juramento de posse, o Diretor se compromete a zelar pelas normas da USP. Portanto, cabe a este Diretor assumir integralmente a sua responsabilidade por qualquer vício de forma nesse processo.

Vamos ao caso específico dos processos seletivos em pauta.

Há mais de um ano, quando percebi que tínhamos seis novos claros docentes, percebi também a enorme responsabilidade com o futuro do Instituto. Quando fui contratado, há trinta anos, por um ilustre Professor Catedrático que mal me conhecia, eu era apenas bacharel, aluno de mestrado. Certamente eu era uma promessa, como tantos outros colegas contratados naquela época. Mais tarde os catedráticos foram substituídos pelos departamentos, que começaram a exigir o título de mestre e, mais tarde ainda, o título de doutor. Hoje é possível exigir doutoramento, pós-doutoramento, trabalhos publicados, independência científica, etc. A grande diferença está no mercado de trabalho. Nós é que vencemos. Fomos capazes de formar uma pós-graduação forte, que produz gente de muito boa qualidade em diversos cantos do país (acho que são uns cinco ou seis cursos nota 7 na Capes). Portanto, temos gente de alto padrão para selecionar. Foi exatamente por isso que nós propusemos um processo seletivo aberto durante tanto tempo (foram quatro meses, que se transformaram em cinco), anunciado tão amplamente, em todo o país, por todos os meios. Também propusemos duas fases, pois já sabíamos que o número de candidatos poderia ser grande. Além disso, introduzimos a idéia da carta de recomendação, prevista nas Normas da CLR, que muitas vezes não diz nada, é totalmente anódina, mas que pode ser extremamente reveladora. A primeira fase, de caráter eliminatório, poderia ser feita internamente, por membros da casa. Na segunda fase, com poucos candidatos, selecionados pelo currículo, a escolha deveria ser mais rigorosa, com maioria de membros externos.

Frente a essas inovações, decidimos fazer uma consulta à CJ sobre o processo eliminatório com duas bancas distintas. Esta consulta gerou manifestação da CLR, com nova edição das regras do jogo. Levando em conta o parecer da CJ, modificamos o edital, esclarecendo o caráter da análise do memorial na primeira fase, ampliando os prazos por mais um mês, mas mantendo as inscrições que já tinham sido feitas. Essas modificações no edital, praticamente escritas de próprio punho pelo Procurador-Chefe, foram produto de um longo serão de direito administrativo! Portanto, mais uma vez eu estou confiante nos aspectos formais de tudo o que foi feito. Sinto-me responsável pelas decisões, que foram tomadas com a maior cautela. O parecer apresentado na Congregação é um testemunho eloqüente dos nossos esforços.

Homologados os resultados finais dos processos seletivos ^Ö e apreciado o recurso pela Congregação - podemos fazer um balanço do que aconteceu, analisar o perfil dos candidatos, avaliar a importância dos novos mecanismos. Enfim, discutir o mérito da questão. Esta é uma tarefa que o CTA ainda não conseguiu fazer. Mas é uma tarefa importantíssima.

Como eu não participei das bancas, tenho idéias muito preliminares que gostaria de partilhar com os colegas.

Em primeiro lugar, foi um sucesso ter tantos candidatos. No caso do DFMA, com 36 candidatos para uma única posição, foi um exagero, refletindo principalmente a falta de oportunidades no sistema federal. No entanto, mesmo em áreas mais restritas tivemos cerca de dez candidatos.

Acho que posso fazer alguns comentários sobre os quatro candidatos indicados. Fui examinar os currículos e fiquei muito bem impressionado: todos os candidatos indicados têm um currículo melhor do que o meu, quatro anos depois do meu doutoramento, quando eu já estava contratado e prestei um concurso de Livre-Docência. Sob este aspecto, estou profundamente feliz: missão cumprida! Também tenho a impressão de que não estamos frente a meras promessas. Todos eles são pesquisadores independentes, não precisam ser caudatários de ninguém, têm os seus próprios projetos, somando-se de forma criativa ao potencial acadêmico do Instituto. As notas da prova didática, que refletem em parte a maturidade dos candidatos, também foram ótimas. Lastimo que o claro de biofísica não tenha sido preenchido: no DFGE, estamos perdendo a oportunidade de contratar um jovem físico experimental, de ótimo nível.

Vendo em retrospectiva, não foi boa a idéia de incluir apenas os "chefes de departamento" na banca da primeira etapa. Certamente foi um erro político. Num ambiente infelizmente politizado, isso conduz a suspeitas, absolutamente infundadas, de manobras políticas terríveis. Eu sempre respondo que "honi soit qui mal y pense". Os meus colegas de formação socialista, poderiam se lembrar que Marx, na abertura de sua Introdução à Crítica da Economia Política, cita Dante na porta do inferno: "Qui si convien lasciare ogni sospetto...". Na ciência e no partido acadêmico não cabe lugar à suspeita. Durante a minha gestão, eu me orgulho de não ter jamais pressionado, constrangido ou influenciado, de qualquer forma, através de qualquer instrumento, qualquer membro de banca indicada. Esta é a nossa grande tradição acadêmica: podemos argumentar e divergir na indicação das bancas. Mas, bancas indicadas, bico calado! O julgamento dos pares, exercido pelas bancas indicadas, deve prevalecer acima de qualquer opinião pessoal.

Vamos novamente aos "chefes de departamento", reduzidos a meros burocratas em matéria do Jornal do Campus (embora eu ainda espere que haja um desmentido). Eu me orgulho de trabalhar com o Vice-Diretor e os Chefes de Departamento. Todos os membros da banca da primeira fase (Professores Adalberto Fazzio, Alinka Lepine, Hercilio Rechenberg, Elcio Abdalla, Antonio Figueiredo, Iberê Caldas e Mário Oliveira) são pesquisadores extremamente atuantes, classificados nos níveis mais altos da carreira universitária e do CNPq, com reconhecimento internacional, cuja presença e atuação seriam motivo de orgulho em qualquer instituição do país. Nem a mim e nem a nenhum deles cabe a qualificação de burocrata. Os meus trabalhos científicos e a minha contribuição didática, em particular, estão disponíveis para qualquer escrutínio. Felizmente aqui no nosso Instituto o Diretor e o Chefes de Departamento tradicionalmente assumem responsabilidades acadêmicas. Seria trágico se não fosse sempre assim. Lastimo que um possível erro político, feito com a mais absoluta boa fé, esteja sendo tão explorado.

Talvez a banca tenha sido muito rigorosa, tenha deixado para a segunda fase um número pequeno de candidatos. Francamente, aí está outro possível erro político. Os protestos seriam menores com uma banca mais leniente, deixando passar para a segunda etapa um número ligeiramente maior de candidatos (provavelmente mais fracos, que não iriam alterar o resultado final). Mas um pequeno erro político não constitui vício formal, dando margem ao questionamento dos julgamentos de mérito. Será que uma banca diferente, com especialistas externos, poderia agir de outra forma? Talvez. Mas talvez fosse mais rigorosa ainda, eliminando um número maior de candidatos. De qualquer forma, esta é uma mera especulação, que não pode ser minimamente testada. Deve-se conceder que há uma boa probabilidade de que a banca original tenha agido na medida certa, pois ela analisou e comparou em detalhe, durante vários dias, os currículos de mais de 75 candidatos, tomando todas as decisões por ampla maioria.

Cabe agora uma observação sobre o Jornal do Campus, publicação do Departamento de Jornalismo da ECA, que chegou às mãos de vários colegas. De fato, fui assediado e consegui fugir de duas jovens alunas do curso de jornalismo. Quando o cerco apertou, tentei entrar em contato com o Prof. Coelho, editor do jornal, mas não consegui encontrá-lo. Telefonei então ao Diretor da ECA para dizer que qualquer declaração, com os processos em andamento, seria no mínimo pouco apropriada. Também disse que me colocava à disposição para uma entrevista quando os processos estivessem encerrados. Muitos colegas sabem o que ocorreu. Com uma manchete de primeira página, o jornal foi fartamente distribuído aqui no Instituto, durante a realização da segunda fase de dois processos que ainda estavam em andamento. Não sei se isso perturbou as bancas ou os candidatos. Um dos candidatos, felizmente indicado, comentou comigo que leu a matéria imediatamente antes da sua prova didática. Na minha opinião, foi uma forma sutil de pressão.

O que fazer nos próximos processos seletivos para a contratação de docentes aqui no Instituto?

Embora o CTA tenha ampla autonomia para decidir sobre estas questões, não tenho nenhuma objeção às propostas do DFAP. Não me parece necessário colocar os chefes de departamento na primeira fase. Alguns especialistas externos podem certamente ajudar. Além disso, em todos os níveis da carreira temos pesquisadores ativos, de excelente qualidade, que representariam muito bem a instituição. Bancas corretamente indicadas pelos departamentos raramente sofrem mudanças. O item essencial é a divulgação ampla, atraindo o maior número possível de candidatos. Fiquem atentos aos processos seletivos com dois ou três candidatos apenas! Atualmente, como ficou provado nas últimas semanas, há candidatos de nível excelente, que não se prestam a um trabalho de coadjuvante. A divulgação ampla vai inibir qualquer apadrinhamento. Este é o ponto essencial. Por outro lado, atraindo muitos candidatos, o procedimento somente se torna viável com a organização de duas fases distintas. Os processos seletivos que acabamos de realizar mostram que a banca externa, com especialistas da área, ganha eficiência quando o número de candidatos é relativamente pequeno. Além disso, tem sido difícil reunir uma banca de bom nível, durante um tempo mais longo, para examinar as provas de uma dezena de candidatos. Num universo menor, as provas são mais detalhadas e profundas, e os resultados mais justos frente aos próprios interessados.

Vejo com otimismo o futuro de novas contratações. A disponibilidade de pessoal qualificado é muito mais expressiva. Espero que, nos processos futuros, sejam escolhidos docentes com o mesmo calibre dos quatro candidatos que acabam de ser selecionados.

Silvio R. A. Salinas, Diretor