DISCURSO DE POSSE
7 de março de 2006

O cargo de Diretor do Instituto de Física da USP, no qual estou sendo empossado hoje, não é simplesmente uma honraria que me é concedida. Ele significa uma enorme responsabilidade, que assumo com entusiasmo e motivação.

O Instituto de Física nasceu como um pequeno departamento da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, em 1934, praticamente junto com a Universidade de São Paulo. Sob a iniciativa de grandes pesquisadores, tais como Gleb Wataghin (indicado por Enrico Fermi a Teodoro Ramos) e seus discípulos Marcelo Damy e Mario Schenberg, iniciou-se a construção de uma Instituição norteada pela excelência. Posteriormente, vieram várias gerações com grandes pesquisadores, com alguns dos quais tive a oportunidade e felicidade de conviver em meus 37 anos como docente desta Universidade.

Um "Instituto" que nasceu dentro de uma sala de aproximadamente 60 m2, abrigada na Escola Politécnica da Rua Três Rios, transformou-se praticamente num "campus" de per si, incluindo dezenas de prédios, laboratórios, bibliotecas, salas de trabalho e aula, em uma área total de mais de 45.000 m2.

Atualmente, a comunidade do IF conta aproximadamente com um corpo de 160 docentes, com sua quase totalidade em RDIDP, cerca de 300 funcionários não docentes, aproximadamente 1500 alunos de graduação e 400 alunos de pós-graduação.

Somos a maior escola de graduação em Física do Brasil e formamos anualmente o maior contingente de licenciandos em Física do país. Ao mesmo tempo, abrigamos a maior escola de pós-graduação em Física dentre as demais instituições de pesquisa, com cerca de 100 teses de Doutorado e dissertações de Mestrado defendidas anualmente. Nossa pós-graduação em Física constitui-se em referência nacional, tendo obtido ótima avaliação em sucessivas oportunidades, com nota máxima atribuída pela CAPES (nota 7). Também somos a sede de um programa de pós-graduação interunidades em ensino de ciências, em parceria com a Faculdade de Educação e os Institutos de Química e Biociências, com nota máxima na avaliação pela CAPES.

Ao longo de sua existência, o IF tem se caracterizado como um Instituto de pesquisa no qual a excelência e abrangência temática de suas atividades são perseguidas com perseverança. Anualmente, o IF publica mais de 500 trabalhos científicos em revistas internacionais das mais conceituadas. A abrangência e excelência das atividades de pesquisa tornaram o IF singular e líder no plano continental. Tenho a convicção de que o IF tem contribuído significativamente para a definição do tão mencionado "padrão USP".

Ao longo de sua trajetória, o IF tem investido sistematicamente em pesquisas na "fronteira do conhecimento", fronteira esta que, com a rápida evolução da informação e conhecimento, se torna cada vez mais complexa de qualificar.

Dentre as várias áreas da Ciência, mais precisamente as exatas, talvez nenhuma área atue num universo tão amplo quanto a Física. A Física trata o Universo, agora com "U" maiúsculo, desde seus menores constituintes identificados, tais como os quarks e partículas elementares, até a evolução e formação do Universo com suas galáxias, passando pela constituição da matéria em seus vários estágios.

Recebo de meus antecessores um Instituto com esse perfil de excelência. Podem todos, portanto, avaliar o desafio que enfrentarei para contribuir positivamente nessa trajetória.

O IF tem se caracterizado, essencialmente, como Instituição de pesquisa básica e entendemos que deva ser, de fato, uma Instituição de pesquisa no sentido amplo e abrangente. Deve estar voltado à pesquisa de qualidade, de conseqüências diretas e relevantes para a sociedade. Deve procurar "aproximar-se do ensino e aprendizado", como menciona nossa Pró-Reitora de Graduação, Profª Selma, contribuindo para educar qualitativamente os cidadãos e atuando na formação e reciclagem de professores do ensino básico, médio e superior, além de promover a cultura científica no âmago da sociedade. A USP e, em particular, o IF, não pode negar sua vocação de Instituição pública, pois, cada vez mais, a sociedade lhes solicita uma participação mais efetiva na construção de seu futuro.

Para isso, novos paradigmas devem ser definidos, sem violentar a vocação original da Instituição. Será preciso manter sua excelência e vanguardismo, inerentes às características que nortearam a criação de nosso Instituto, e ao mesmo tempo mobilizar seus recursos para o combate à desigualdade e viabilização de processos de inclusão social. Ficamos satisfeitos ao verificar que 55% dos ingressantes no curso de licenciatura são originários de escolas públicas. A sociedade anseia por uma inserção mais direta da Universidade em suas questões centrais, seja por uma interação significativa com o setor produtivo nacional, seja por seu potencial de inovação tecnológica, seja pelo desenvolvimento de pesquisas multidisciplinares e, sobretudo, por sua vocação de atuação no campo formativo e educativo.

Pretendemos, nos quatro próximos anos, incluir tais questões em nossa agenda, priorizando a formação de recursos humanos com qualidade, valorizando a pesquisa fundamental e sua infra-estrutura, ao mesmo tempo, apoiando o investimento em áreas estratégicas. Para caminharmos nessa direção, algumas metas específicas já estão delineadas, sem prejuízo de uma discussão mais ampla e permanente com toda a comunidade.

Temos plena disposição para o entendimento com todos os grupos do IF. Esta gestão não será corporativa e as ações serão no sentido de agregar a comunidade. Pretendemos dirigir nosso Instituto em conjunto com todas as instâncias institucionais e contando com a participação de todos, docentes, funcionários não docentes, estudantes de graduação, pós-graduação e pós-doutores, porque somos sabedores de que todos têm contribuição a oferecer.

No campo da educação básica, somos a Instituição que mais forma licenciados em Física no país, com uma média de 60 professores ao ano. Esse número, ainda que expressivo no panorama das instituições de formação, é claramente insuficiente. Será necessário estreitar mais os vínculos entre formação inicial e atuação profissional dos professores, incentivando projetos de ação e intervenção nas escolas, além de uma atuação expressiva na capacitação de professores, através de uma estrutura de formação continuada, articulada e sistemática, superando a forma esporádica oferecida atualmente.

Na área da educação científica, necessitamos de uma atuação mais abrangente, através da disseminação do saber acumulado, voltada para o público em geral, dando continuidade aos projetos atuais, como Show da Física, atuação nos museus de ciências e palestras em centros culturais. Aumentaremos nossa contribuição social na formação de recursos humanos, com o aprimoramento e atualização da formação graduada, mantendo a qualidade em padrões internacionais, mas, ao mesmo tempo, fazendo frente aos altos índices de evasão.

Isso significa buscar, dentro dos padrões institucionais reconhecidos, uma flexibilização das estruturas curriculares, estabelecendo percursos de formação interdisciplinar, exigências atuais da produção do conhecimento. Significa, também, adequar nossa formação às exigências profissionais atuais, para além do estritamente acadêmico, estimulando vínculos institucionais com centros tecnológicos, parques produtivos e indústrias. O Instituto de Física deu início a uma discussão sobre o perfil pretendido de seus formandos no bacharelado, delineando opções mais atuais. Cabe agora buscar uma convergência neste processo para sua implementação de forma consensual. Estaremos, dessa forma, contribuindo para criar novos espaços de atuação profissional para físicos nesses âmbitos e, ao mesmo tempo, promovendo uma aproximação de nosso corpo docente e do conhecimento por nós acumulado desses possíveis interessados. O apoio da Pró-Reitoria de Cultura e Extensão é indispensável neste sentido.

Assim, acreditamos que a evasão se enfrenta através da aproximação entre nossas metas formativas e os perfis profissionais de interesse social, mas também com apoio e suporte específico aos alunos durante os anos de graduação.

Nossa pós-graduação em Física, com nota máxima na avaliação CAPES, já está consolidada e madura, e pode continuar contribuindo de forma importante no processo de internacionalização da Universidade. A pós-graduação interunidades avança para uma nova etapa, agora com o programa de doutoramento, e precisa de todo apoio para manter a excelência que adquiriu até aqui. Uma convergência de ações entre a CPG, CPGI, CG e Comissão de Pesquisa poderá, com o uso de mecanismos como a Iniciação Científica, estágios e projetos de apoio ao ensino, contribuir para um melhor aproveitamento de nossos recursos. Nossa liderança no plano continental, claramente estabelecida na pós-graduação em Física, pode e deve ser estendida ao plano global, incluindo Instituições do primeiro mundo. Já hospedamos, em nível de pós-doutoramento, mais de 70 pesquisadores, muitos dos quais da Europa, Estados Unidos e Japão. Devemos ampliar este projeto para o nível de doutoramento.

Não podemos minimizar a importância de uma maior aproximação com o corpo discente, comprometendo os estudantes com os projetos da Instituição, estimulando suas iniciativas e intervenções, com a grandeza e disponibilidade que caracterizam essa faixa etária.

Precisamos também desenvolver uma cultura de avaliação construtiva e não persecutória. A pesquisa já possui alguns mecanismos, mesmo que incompletos e imperfeitos, entretanto, o ensino ainda está longe desta situação. Devemos implementar mecanismos de incentivo ao ensino de qualidade e produção de material didático inovador.

A infra-estrutura operacional, financeira e administrativa eficiente receberá atenção especial através da otimização dos procedimentos de trabalho, valorização do corpo de funcionários não docentes, e principalmente através de um programa de qualificação profissional do conjunto dos funcionários. O Instituto pretende oferecer ao Departamento de Recursos Humanos da Universidade sugestões claras para um plano de carreira que contemple as necessidades diferenciadas do IF, e conseqüentemente de outras Unidades da USP.

Temos que discutir e propor uma política científica como parte importante de nosso projeto acadêmico, que permita manter e aumentar nossa liderança, sem prejuízo da liberdade acadêmica, fundamental na busca da vanguarda e na produção do conhecimento. Entretanto, devemos incentivar uma contribuição coletiva na identificação de novas áreas estratégicas de pesquisa, no atendimento das necessidades tecnológicas nacionais, fundamentais para o desenvolvimento do país. A modernidade exige o desenvolvimento de pesquisas inter e multidisciplinares. Neste ponto em particular, temos a convicção de que a Pró-Reitoria de Pesquisa pode desempenhar um papel fundamental de integração, propiciando a criação de redes de pesquisa interunidades.

O IF deve assumir suas responsabilidades de liderança no campo da pesquisa, buscando estimular projetos de cooperação e ações de intercâmbio interinstitucionais, promovendo articulações e apoiando centros emergentes, especialmente no Estado de São Paulo. Essas são algumas medidas, entre outras, que podem potencializar ainda mais a utilização dos recursos teóricos e experimentais disponíveis na Instituição.

A Profª Suely Vilela tem seguidamente apontado a importância de uma maior inserção internacional da Universidade de São Paulo, que certamente contribuirá na consolidação e ampliação de sua liderança acadêmica e social. A Física tem uma longa tradição em intercâmbio internacional, dada sua característica na discussão e definição de questões de fronteira. Algumas pesquisas de fronteira em Física são desenvolvidas com o uso de grandes equipamentos disponíveis em poucos e grandes laboratórios multinacionais. O Brasil se torna cada vez mais um ator importante e tem contribuído na formulação de mecanismos de intercâmbio em conjunto com as agências de fomento.

O IF tem, portanto, um longo caminho a percorrer, ao longo do qual deverá colher frutos relevantes, honrando as suas origens e preparando o seu futuro.

O escritor espanhol Antonio Machado tem um verso que resume meu sentimento neste momento:

"Caminante no hay camino, se hace camino al andar."

Espero, ao percorrer este caminho, poder oferecer uma contribuição à altura daqueles que idealizaram nosso Instituto, atingindo nossas metas mediante um diálogo permanente entre todos os membros da comunidade do IF, em um convívio respeitoso e construtivo, mesmo nos momentos de conflitos inerentes a uma comunidade participativa e plural.

Temos consciência de que cada Unidade deve ser parte integrante e integradora da USP. Esperamos contar com o apoio da Reitoria e apoiar suas proposições. Buscaremos uma sintonia do IF com a Administração Central em torno da construção de um projeto comum de Universidade, em que as ações geradas nas Unidades encontrem eco e contribuam para o êxito das missões da USP.

Muito Obrigado.

Alejandro Szanto de Toledo

 
Instituto de Física - Rua do Matão, Travessa R, 187. CEP 05508-090 Cidade Universitaria, São Paulo - Brasil
Caixa Postal 66318 CEP 05314-970 Fax (55) (11) 3814-0503
Email: if@edu.usp.br